quinta-feira, dezembro 30, 2004

Sex and the city



Até cerca dos dezassete, dezoito anos de idade, a nossa vida emocional consiste numa espécie de amálgama de relações conturbadas em que se torna difícil definir o papel de cada personagem num guião ilegível de situações complicadas. Namoramos com amigas, somos amigos das nossas grandes paixões e, se tivermos sorte, fazemos sexo com pelo menos algumas delas... No entanto, com a chegada da maturidade (ou de algo que se assemelha a isso) começamos a tratar a nossa vida com um pouco mais de cuidado, avisados dos riscos tremendos que advêm das relações pouco equilibradas. E com esse cuidado pode vir um abrandamento indesejado da vida sexual.
O afamado período universitário é sempre visto socialmente como uma fase da vida de agitação sexual em que se multiplicam as parceiras do coito e as situações de engate ocasional. Esta situação é devida à extrema facilidade de encontrar raparigas interessadas em encontros estritamente sexuais, caso se seja pouco selectivo e minimamente bem-parecido. No entanto, trata-se também da fase da vida em que se torna evidente o pouco gratificante que é praticar sexo apenas com interesse lúdico e sem qualquer tipo de relação emocional, o que pode originar um período de virtual desertificação da cópula, caso não se viva uma relação estável.
Na entrada dos trinta, com vida orientada, dinheiro e uma incontornável dose de estilo, regressa a tendência para encontros amorosos ocasionais e surgem os conhecidíssimos "solteirões", tubarões brancos num charco de pequenas douradas. Estes espécimes desorientados vivem uma existência superficial em que a sua solidão evidente é infrutiferamente tapada com um lençol curto de encontros voláteis, mantendo o privilégio inquestionável de serem os heróis de uma horda de jovens impressionáveis que os seguem como Messias. Quando finalmente são atingidos pela evidência de terem uma vida à deriva, passam a uma fase mais estável (são pescados por uma das douradas...) e entram numa vida sedentária de que se vão para sempre arrepender; mas a insatisfação faz parte do espírito humano, chegando quase a ser um mal saudável.
Podemo-nos tentar convencer de que o sexo é uma espécie de entretenimento totalmente distinto do relacionamento humano, como uma ida ao cinema ou uma massagem tailandesa, mas no fundo sabemos que isso não é verdade. Por muito bom que seja fisicamente deixa sempre um impacto sentimental (principalmente nas mulheres mas também nos homens) que nos impele a geri-lo com maior cuidado e atenção. Uma vida sexual moderada leva a um equilíbrio espiritual indispensável para uma existência calma e recheada de paz interior.

terça-feira, dezembro 28, 2004

Otto e mezzo


Na história da humanidade houve um punhado de pessoas que conseguiram deixar a sua marca pessoal no vastíssimo mundo cultural. Numa obra eterna conseguiram não só exprimir a mensagem que se remoía na sua garganta, mas também fazê-lo de uma maneira própria que abriu uma janela para o seu complexo espaço interior.
Todos sabemos reconhecer essas obras especiais que viajam no espaço literário, cinematográfico, musical... Estamos habituados a sentir uma miscelânea de experiências no visionamento de qualquer obra de qualidade, mas quando deparamos com uma destas obras-primas somos totalmente arrebatados, ficando num estado de coma temporário que só termina quando fechamos de novo o universo que se abriu a nossos pés (há até muitos que nunca regressam)!
Quais as origens desta anormal capacidade de comunicação? Toque divino, trabalho, brilhantismo genético? Pura e simplesmente sorte? Talvez um pouco de cada uma... O fundamental é que não é uma façanha ao alcance de todos, e deprime-nos pensar que não seremos capazes de a alcançar.
O fechar do Universo magnífico criado por um artista exímio traz-nos de volta para a nossa vida banal e desprovida de experiências transcendentais. Tal como uma droga, a vivência com as grandes obras deixa-nos sequiosos de mais um momento de contacto divino e passamos a viver na ânsia de voltar a viajar nas horas únicas de descoberta de uma obra nova.

sábado, dezembro 25, 2004

100 Girls



Ao contrario do que geralmente se pensa, existem mais homens que mulheres. Na realidade, por cada 100 mulheres que nascem há 105 homens no nosso planeta... É como um jogo das cadeiras em que pelo menos cinco acabam em pé.
Quando um homem diz determinadamente que destes três mil e duzentos milhões de exemplares femininos há apenas um que lhe interessa deixa sempre um cheirinho a razão para desconfiar. Parece quase impossível não haver no meio de tanta gente uma pessoa quase igual à mulher que ama, apenas com melhorias naqueles pequenos defeitos que todas as pessoas têm! Mas quando uma pessoa, como eu, está apaixonada é muito difícil fazê-la perceber o ridículo da sua posição. Afinal, quais são as razões sobrenaturais que nos fazem apaixonar por uma determinada rapariga?
A parte de ficar desesperadamente interessado é fácil... Qualquer rapariga com um mínimo de destreza nas artes do engate consegue, apenas seguindo o protocolo, levar um homem à loucura. Dando atenção ou desprezo nas alturas certas, primando no jogo sujo da manipulação, uma rapariga consegue colocar a sua presa na posição chata da obsessão. O problema é passar de simples motivo de obsessão para o estado de mulher dos nossos filhos! Mesmo o homem mais perdido de paixão consegue perceber que aquilo que sente é passageiro.
Na minha opinião esse derradeiro passo é dado graças às circunstâncias envolventes mais do que à mulher em questão. Quando existe um passado construído a custo (bem ou mal) que nos uniu de uma forma sólida a uma rapariga ficamos com a ideia de que para ficarmos tão naturalmente com outra pessoa qualquer seria necessário tempo, suor e lágrimas que não estaríamos dispostos a dar. Se a rapariga em questão tiver qualidades evidentes e uma unicidade, uma aura característica, o nosso vínculo torna-se ainda mais eterno e irremediável e vemo-nos numa situação permanente de exclusividade.
Longe de mim tentar reduzir o amor eterno a uma forma de preguiça! Apenas quero deixar claro que não acredito em amor à primeira vista. O amor é um estado de intimidade e de união que nasce mais do passar do tempo que do encaixe perfeito entre os dois envolvidos. Como tal, quando dizemos "Ela é a única mulher para mim!" o que estamos realmente a dizer é "Demorei dois anos a ficar tão intimamente com ela, só se fosse parvo é que ia passar por isto tudo de novo!". Mais ainda, quando dizemos "Da primeira vez que a vi fiquei logo apaixonado!" o que queremos dizer é "Ainda por cima é BOA!"...
E acabo aqui este meu grito de dor de cotovelo.

quinta-feira, dezembro 23, 2004

Fight Club



Mais que o vomitado nas calças, mais que as conversas parvas e desprovidas de interesse, mais até que os devaneios sexuais, a violência induzida é o problema mais grave do excesso de consumo de bebidas alcoólicas. As histórias de lutas nocturnas são vulgares, passando invariavelmente por um qualquer tipo de alegria na forma como são descritas. Poder-se-ia quase dizer que se nota um bocadinho de orgulho no relato destas pequenas façanhas bélicas masculinas, isto apesar da evidente estupidez que as envolve.
No entanto, não me parece que o álcool seja a causa dos instintos violentos nestes gladiadores amadores, mas apenas um agente dissolvente das barreiras sociais com que os costumam aprisionar. O aglomerado de raivas e agressividades que armazenamos no dia a dia aproveita o rebentar do dique para inundar uma postura até então serena de rasgos de agressão física, transformando uma saída calma e agradável num assustador circo de violência.
No final desta linha de pensamento resta-me concluir que a atitude a tomar é controlar a agressividade de que não me consigo ver livre e resistir constantemente ao envolvimento em confrontos físicos. Parte disto terá inevitavelmente de passar por uma redução no consumo de bebidas alcoólicas. Entrei agora num esquema de desintoxicação em que o primeiro passo, que já tomei, é o típico: reconhecer que se tem o problema.
Paz.

quarta-feira, dezembro 22, 2004

Cupid



Se olharmos com suficiente atenção para qualquer coisa da vida corremos sérios riscos de deparar com a fatal realidade da sua futilidade. Quando a própria vida é intrinsecamente inconsequente (pelo menos para as mentes inteligentes, modestas e corajosas que admitem não estar cá “por uma razão”) é quase paradoxal encontrar alguma acção com sentido! Mas então o que nos impede de viver superficialmente, comida, sexo e almofada, ou até mesmo de cometer o suicídio? Afinal vamos todos morrer na mesma…
A questão é que, apesar de inconsequente, a vida é mesmo muito boa! Ou pode ser, se seguirmos uma determinada linha filosófica personalizada. E por mais que os percursos que trazem felicidade a cada indivíduo se distingam conforme a genética pessoal, convergem sempre na mesma linha comum: o amor. Estou plenamente convencido de que qualquer vida desprovida de vertente amorosa é necessariamente cinzenta e aborrecida, levando o utilizador a um estado de insatisfação que o impede de usufruir adequadamente das restantes maravilhas da sua existência.
Dito isto, torna-se clara a razão pela qual cada vez mais pessoas põem a sua vida amorosa acima das amizades ou até da carreira profissional. E é apenas legítimo que assim seja! Diria mesmo que aqueles extraviados que se habituam a um estado de solidão sentimental entram numa situação psicologicamente perigosa que está assustadoramente próxima da degeneração em depressões profundas. Por outro lado, nunca conheci um romântico incurável que fosse infeliz! Acontece ficarem tristes, mas a tristeza é uma emoção passageira; a sua vida é sempre pautada por linhas berrantes de felicidade!
Façam o que entenderem quanto às opções pessoais de vida que vos trazem felicidade, matem ou salvem, pintem ou escrevam, gritem ou cantem, mas vivam sempre em função do amor! Porque não é qualquer sonho que comanda a vida, é preciso ser um sonho assim tão bom. E com o sonho do amor não conseguimos dar significado à totalidade da existência universal, mas damos significado aos cinco minutos em que cá estivemos.

terça-feira, dezembro 21, 2004

Serial Experiments: Lain


Descascar o quoutidiano e explorar os perturbadores motivos dos acontecimentos... Desde a natureza humana às regras do Universo, tudo pode ser teorizado à exaustão e destituído de incertezas e acasos probabilísticos.
Escrevo estes textos relacionando os escassos conhecimentos empíricos que tenho de vivências passadas com racicínios simples, na pueril esperança de viajar nos estudos humanos e de nos conhecer a todos um bocadinho melhor.